domingo, 31 de julho de 2011

Dráuzio Varella vai a calha do Juruá mostrar que habitantes sofrem de hepatite B crônica.

Esta semana, no dia Mundial da Hepatite, a Organização Mundial da Saúde (OMS) chamou atenção para o aumento de casos da doença. Hoje, 500 milhões de pessoas no mundo inteiro são portadores do vírus da hepatite B ou C. No Brasil, o doutor Drauzio Varella viajou até uma região esquecida do nosso país que está pedindo socorro. Justamente por causa da forma rara da doença, lá as pessoas são vítimas de um ataque duplo: dois tipos de vírus da doença, que juntos se tornam ainda mais violentos. “Eu não posso andar no sol, pular, correr”, diz um menino. “É inacreditável, o nosso povo não acredita que esses vírus é capaz de passar de uma pessoa para outra através de sangue, através da relação sexual”, diz o professor Valdê Acrino Yawanawá . Dependendo da região do estado do Acre, 3 a 20% dos habitantes sofrem de hepatite B crônica. É a principal causa de morte em jovens de 15 a 25 anos.
Para tornar a situação mais dramática, um em cada cinco portadores de hepatite B também está infectado pelo vírus da hepatite Delta. Os dois vírus, ao mesmo tempo, na mesma pessoa, causam uma doença muito mais grave. Na região Norte, muitos portadores de hepatite B mudam para as capitais em busca de tratamento. Em Rio Branco, os ambulatórios estão lotados de pacientes como Antônio, de de 13 anos, que crescia em sua cidade, Boca do Acre, até apresentar os primeiros sinais de hepatite B crônica. No caso dele, para piorar, combinada com a hepatite D, também conhecida como Delta. O doutor Drauzio pergunta, no ambulatório, quem da família teve a idéia de levar Antônio para Rio Branco. “Eu fui a Boca do Acre passear e quando cheguei lá, vi o Antônio naquela situação, muito amarelo, o estômago muito alto. Eu digo, esse menino está doente com hepatite. Trouxe ele para Rio Branco, fizemos os exames e foi constatado hepatite”, diz o assistente social Claudenor Magalhães.
Drauzio pergunta sobre a rotina doméstica do Antônio que tem que ir ao serviço de atendimento. “Toda semana trago ele para tomar o medicamento dele, o interferol”. “Eu tomava o remédio e só ficava dormindo, dor de cabeça, não podia nem mexer a cabeça”, fala Antônio. “Ele tentou fazer ainda o tratamento em Boca do Acre, mas tem época que a estrada fecha total. E aí? Cadê o dia do remédio? E como é que vem? “, explica o assistente social. Cruzeiro do Sul, à beira do rio Juruá, está a 680 quilômetros da capital do Acre, Rio Branco. A estrada entre duas cidades só é transitável no verão que dura, no máximo, quatro a cinco meses. A viagem de barco leva quase 30 dias. Exames laboratoriais, vacinas e medicamentos só disponíveis na capital dependem totalmente de transporte por avião. Apesar das distancias e das dificuldades, Cruzeiro do Sul dá exemplo de como devem ser enfrentadas as hepatites B e D na Amazônia. A floresta impede o acesso aos serviços médicos. O combate às hepatites B e Delta, na Amazônia, dependem da dedicação de profissionais como a infectologista Sauiane Negreiros. Drauzio Varella pergunta se com toda a experiência, a que a infectologista atribui a concentração de casos de hepatite B na região amazônica, especialmente, no Acre. “Eu crio que para nós, a transmissão familiar esteja muito vinculada a esse grande número de casos que nós temos aqui. Nós observamos o compartilhamento de muitos objetos pessoais, inclusive, escova de dente. Nós sabemos que no ato de uma escovação pode produzir o sangramento, e isso pode ser um fator de transmissão, lâminas de barbear. Então, é uma para a família inteira”, explica a infectologista. Na Amazônia, as hepatites são uma epidemia difícil de controlar, porque as distâncias são enormes. Para atender as comunidades mais isoladas existem serviços itinerantes que viajam pelos rios. Nessas comunidades, muitos indígenas perdem a vida por causa das hepatites B e Delta. A hepatite B é uma doença complicada que evolui no decorrer de muitos anos. Nesse período, o doente precisa de assistência médica, exames laboratoriais e tomar remédios que provocam reações indesejáveis. Mas veja o problema de quem mora em uma região como essa. Drauzio Varella saiu de carro de Cruzeiro do Sul, levou quase quatro horas para chegar no Rio Gregório, que é um afluente do Rio Juruá. Foi de barco e viajou sete horas e meia pelo rio. E ainda falta uns 30 minutos para chegar na comunidade Yawanawá. Drauzio Varella pergunta ao se é a primeira vez que o agricultor Moisés Yawanawá faz o teste de hepatite. “Não, é a terceira”, conta o agricultor. O médico questiona as outras duas vezes que realizou o teste e ele responde. “Deu negativo”. O professor Valdê Acrino Yawanawá conta que é a segunda vez que realiza o teste. “Novamente fazer o teste, devido ter alguns mosquitos que faz aquelas picadinhas vermelhinhas e criança costuma sempre tocar essa mesma mordidinha com o dente então forma uma bolinha de sangue que pode subir para a gengiva também”. Drauzio pergunta ao professor se ele acha que as crianças em contato, dormindo na mesma rede, podem encostar a ferida de uma na ferida da outra. “Exatamente e se a ferida tiver inflamada vai ter q transmitir para outra pessoa que esta dormindo junta”, declara o professor. Ricardo Yawanawá tem 12 anos e, há alguns meses, começou a ficar fraco e doente. A mãe o levou aos médicos do serviço itinerante. Ricardo sente dores na barriga e é examinado pelo infectologista Martoni Moura e Silva. “Então, Drauzio. Aqui a gente vê já um paciente com o baço aumentado, um fígado também aumentado, palpável, que sugere muito que é um doenca avançada, já um processo de cirrose”, conclui o infectologista. Drauzio pergunta à Marconi por que um menino de 12 anos de idade já chegou nessa fase de cirrose. “É uma peculiaridade que acontece muito na Região Norte com associação do vírus Delta. Então, ele não tem uma fase inicial da doença, ele já começa uma fase de agressão, o que vai levar o paciente a um processo desse”, finaliza. O médico pergunta à enfermeira da Fundação Nacional de Saúde (Funasa) Cássia da Silva quantos portadores de hepatite B ela têm documentados na aldeia. “Documentados na aldeia, nos temos 54 casos de hepatite B”, revela. E de hepatites D, com vírus B e D “nove casos”. Na aldeia, vivem, aproximadamente, 600 pessoas. O vírus da hepatite D é um vírus defeituoso, ele não se multiplica e nem consegue sobreviver se a pessoa não estiver também infectada pelo vírus. Agora, aqueles que adquirem os dois vírus costumam ter uma hepatite muito mais agressiva, uma doença que vem dar cirrose hepática muito mais cedo. Antônio recebe o diagnóstico do médico Marconi com o numero de carga viral, ou seja, a quantidade de vírus. “Há uma queda sensível e isso é bom, significa que está indo bem, temos a esperança de conseguir a cura da doença”, diz Marconi. “O médico disse que está baixando. Espero, no futuro, estar livre dessa doença e brincar tudo o que eu não brinquei”, diz Antônio. Já, Ricardo, tem uma doença que está avançando um pouco mais apresentando sinais de cirrose. “A gente vai encaminhar vocês para o serviço social para vocês irem para Cruzeiro do Sul e assim poderem ter acesso a sua medicação”, diz o infectologista Marconi. A hepatite B é uma tragédia na vida dos indígenas do Acre e do resto da Amazônia. A doença e complexa, o tratamento e difícil e as enormes distâncias entre as comunidades são enormes. Mas hepatite B tem vacina, que tem um complicador: a primeira dose é hoje, a segunda , daqui a 30 dias, e a terceira, daqui a seis meses. Vai exigir recursos e dá trabalho, mas a única saída é vacinar todos os indígenas: bebês, crianças, adolescentes, mulheres, homens, todo mundo.

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